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LIDERANÇA EM TEMPO DE GUERRA
O LEGADO DO BRIGADEIRO NERO MOURA COMPARADO ÀS MODERNAS TEORIAS DE LIDERANÇA 
 

(Prêmio Pacau Magalhães-Motta, ano de 2009, 1º lugar

 

NOTA: 
O conteúdo deste documento reflete a opinião do autor, quando não citada a fonte da matéria, não representando necessariamente, a política ou prática da Associação Brasileira de Pilotos de Caça ou do Comando da Aeronáutica.

 

“Meus camaradas, unamo-nos com um objetivo único, o bem da Força Aérea Brasileira, porque somente assim poderemos ter uma Aeronáutica
forte e respeitada. Unamo-nos com amor também, porque somente o amor constrói para a eternidade.”
 
Brigadeiro Nero Moura

 

1. INTRODUÇÃO


 

“É difícil comandar homens livres em tempo de guerra... Ele (Nero Moura) comandou.”

Brigadeiro Rui Moreira Lima

 
Há pouco mais de um ano, após ter sido designado para comandar uma unidade de caça, deparei-me com profundas questões, tanto de natureza prática quanto filosófica. Neste campo, a questão que mais dediquei atenção foi a dos estilos de liderança, sobre o que havia de mais moderno sobre o tema e quais seriam as pesquisas mais recentes na área. Como resultado, no curto espaço de tempo entre a designação e a posse, entrei em contato com livros e artigos discorrendo sobre teorias e modelos de liderança. Como, em geral, a vasta literatura disponível é muito voltada para o mundo empresarial, uma questão logo me causou grande inquietação: qual entre tantos modelos de liderança seria mais aplicável a uma unidade de caça, e, muito além disso, a uma unidade de combate atuando numa guerra real? A fim de responder a essa inquietação, voltei-me à análise dos grandes líderes da história da FAB, em especial o Brigadeiro Nero Moura, Comandante do 1o Grupo de Aviação de Caça durante a campanha na Itália e Patrono da Aviação de Caça brasileira, a quem tive a felicidade de conhecer pessoalmente. A partir dessa análise, procurei estabelecer um paralelismo entre a postura de um incontestavelmente grande líder com as modernas teorias sobre os estilos de liderança.

Segundo o Tenente-Brigadeiro Nelson Freire Lavenère-Wanderley, em sua “História da Força Aérea Brasileira”, o Grupo de Caça brasileiro obteve um resultado impressionante em suas ações durante a campanha da Itália no último mês da guerra, conforme descrito no relatório oficial do 350o Fighter Group da USAF, ao qual o Grupo de Caça brasileiro estava subordinado. Tal feito muito provavelmente só foi possível, além da extrema dedicação e competência de toda a equipe envolvida, devido aos conceitos vanguardistas de liderança aplicados pelo Brigadeiro Nero Moura na condução de seus comandados.

A partir da descrição dos traços da personalidade dessa figura tão destacada da nossa história, foi possível efetuar uma comparação das características de Nero Moura com aquelas observadas em líderes de sucesso, que foram identificadas por pesquisadores a partir da década de 1960. Os traços da excepcional liderança desse verdadeiro herói nacional podem ser encontrados no célebre livro “Senta a Pua!”, de autoria do Brigadeiro Rui Moreira Lima (1980), além do documentário “Senta a Pua” (1999) dirigido por Erik de Castro e entrevistas com os nossos veteranos de guerra, algumas delas disponíveis na internet através do sítio “Sentando a Pua”.

Este trabalho tem portanto o objetivo de analisar alguns traços do estilo de liderança adotado pelo Brig. Nero Moura ao comandar uma unidade de combate em situação de guerra, e que só posteriormente foram apontados por pesquisadores de diferentes teorias humanísticas da administração como sendo necessários a uma liderança eficaz, de forma a sugerir um modelo de liderança adequado às unidades de combate da FAB.

Entre as modernas teorias de liderança estudadas, devido à delimitação do escopo deste trabalho, focou-se na análise de uma das mais bem aceitas teorias da atualidade – a Teoria da Liderança Situacional -, sem que isso exclua futuras comparações com outras teorias.

A importância deste trabalho reside na possibilidade de, ao estabelecer um paralelo entre as práticas adotadas por um líder de sucesso atuando em situação de guerra e as premissas de uma teoria já amplamente estudada, criar subsídios para o aperfeiçoamento dos líderes da atualidade, bem como melhorar a preparação dos futuros comandantes da Força.

A fim de atingir ao objetivo proposto, este trabalho foi dividido em capítulos, sendo que o próximo trata das Teorias sobre Liderança de uma forma geral; o capítulo 3 detalha o modelo da Liderança Situacional; o capítulo 4 procura correlacionar alguns traços da liderança do Brig. Nero Moura com a teoria da Liderança Situacional; por fim, apresenta-se uma breve conclusão.

  

2. TEORIAS SOBRE LIDERANÇA

“O Brigadeiro Nero Moura foi um grande comandante e um grande amigo, tinha qualidades fantásticas ... é triste dizer ‘ tinha' , mas infelizmente ele já morreu. Era um homem que resolvia tudo com a maior facilidade, com clareza, com simplicidade. Não era de grandes feitos heróicos, de grandes derramações, nada disso; a gente chegava com um problema, ele conversava com a gente e a gente ia embora com o problema resolvido. É assim que me lembro sempre do Brigadeiro Nero. Até pouco tempo, quando fazíamos reuniões na casa dele, a gente conversava sobre coisas que estavam me atrapalhando a vida. Mais que um superior, mais que um comandante, era um pai. Esse é o Brigadeiro Nero para mim ... não quero falar mais que eu fico até emocionado. ”

Brigadeiro José Carlos de Miranda Corrêa

A liderança é um tipo de fenômeno social que ocorre exclusivamente em grupos sociais. Ela é definida como uma influência interpessoal exercida em uma dada situação e dirigida pelo processo de comunicação humana para a consecução de um ou mais objetivos específicos.

Com o desenvolvimento da Administração como uma ciência, os processos administrativos passaram a se basear no método científico, notadamente a partir dos trabalhos de Taylor e Fayol no início do século XX. A nova ciência, baseada em conceitos que posteriormente foram chamados de abordagem clássica da administração, tinha como foco principal o aumento da produtividade das organizações por meio do aumento de eficiência no nível operacional, tendo sido dada pouca ou praticamente nenhuma atenção à liderança nas organizações.

A preocupação com a liderança nas empresas surgiu após a depressão econômica de 1929 nos EUA, que, além de abalar todo o mundo capitalista, motivou a ampliação das fronteiras dos estudos sobre a eficiência das organizações, provocando o aparecimento da Teoria Humanística.

2.1. A Teoria Humanística e a preocupação com a liderança nas organizações

Com esta nova abordagem, a teoria administrativa passou por uma revolução conceitual: a transferência da ênfase antes colocada na tarefa (pela administração científica) e na estrutura organizacional (pela teoria clássica) para a ênfase nas pessoas que trabalham ou participam das organizações. Assim, a abordagem humanística faz com que a preocupação exagerada com a máquina, o método de trabalho, a organização formal e os princípios de administração ceda lugar para a preocupação com as pessoas e os grupos sociais, ou seja, dos aspectos técnicos e formais para os aspectos psicológicos e sociológicos.

O enfoque humanístico da administração ocorre com o aparecimento da Teoria das Relações Humanas nos EUA, a partir da década de 1930, tendo sido possível graças ao desenvolvimento das ciências sociais, notadamente a psicologia e a sociologia.

Essa Teoria surgiu como conseqüência das conclusões da experiência de Hawthorne, desenvolvida por Elton Mayo e seus colaboradores ao realizar experimentos com trabalhadores em uma fábrica da cidade de Hawthorne (EUA), a Western Eletric Company, que fabricava equipamentos e componentes eletrônicos, em 1927 (vide, por exemplo, CHIAVENATO, 2008).

Como conseqüência dela, surge uma nova concepção sobre a natureza do homem: o homem social, baseando-se nos seguintes aspectos:

- os trabalhadores são criaturas sociais complexas com sentimentos, desejos e temores.
- satisfação das necessidades humanas por meio dos grupos sociais.
- o comportamento dos grupos sociais é influenciado pelo estilo de supervisão e liderança.
- as normas do grupo funcionam como mecanismos reguladores do comportamento de seus membros.

A partir deste ponto, intensificam-se os estudos de temas como: personalidade do trabalhador e do gerente, motivação e dos incentivos do trabalho, liderança, comunicação e relações interpessoais e sociais dentro das organizações. A ampla difusão dessas idéias só ocorreu após o término da Segunda Guerra Mundial.

2.2. Liderança

A Administração Científica referiu-se superficialmente à liderança e as suas implicações. A experiência de Hawthorne teve como mérito identificar os líderes informais que determinavam normas e detinham o controle do grupo, criando os alicerces para o desenvolvimento de estudos direcionados à liderança nas organizações. A liderança é necessária em todos os tipos de organização humana. HUNTER (2004) define liderança como sendo “a habilidade de influenciar pessoas para trabalharem entusiasticamente visando atingir aos objetivos identificados como sendo para o bem comum”, podendo ainda ser visualizada, segundo CHIAVENATO (2008) como:

1. Um fenômeno de influência interpessoal – através da comunicação para o atendimento de um ou mais objetivos específicos. Neste caso, a liderança é um fenômeno social. Decorre do relacionamento entre as pessoas de uma estrutura social. A influência é uma força psicológica que modifica comportamentos de forma intencional. Envolve conceitos de poder e autoridade; o poder é o potencial de influência de uma pessoa sobre outras. O poder pode ou não ser realizado. A autoridade é o poder legítimo de uma pessoa, em virtude do seu papel ou posição em uma estrutura organizacional.
2. Um processo de redução da incerteza de um grupo – neste aspecto, a liderança é um processo contínuo de escolha, que permite à organização caminhar em direção a sua meta, apesar de todas as perturbações internas e externas. O líder é escolhido como a pessoa que pode dar mais assistência e orientação. Ao tomar decisão, o líder reduz a incerteza do grupo.
3. Uma relação funcional entre líder e subordinado – é função das necessidades existentes em uma determinada situação, onde a maior parte das necessidades individuais é satisfeita por meio de relações com outras pessoas e grupos sociais. O líder é percebido pelo grupo como possuidor dos meios para satisfazer as suas necessidades. Ele é um estrategista que sabe identificar os rumos para as pessoas.
4. Um processo em função do líder, dos seguidores e de variáveis da situação – depende das características pessoais e da abordagem situacional, ou seja, a liderança ocorre em função das características pessoais do líder, dos subordinados e da situação que os envolve.
  
2.3. Os estilos de liderança

São várias as perspectivas teóricas a respeito dos estilos de liderança. Existem enfoques centrados nos líderes, em seus seguidores, na interação líder-seguidor, no papel da situação na liderança, e até enfoques que tentam integrar todos estes aspectos (DESCALS, 2005). A maioria prefere abordar o tema através da caracterização de estilos ou características gerenciais que levariam determinado profissional a ser qualificado como um bom exemplo de liderança.
A literatura a respeito do tema é muito vasta, mas na prática não é tão simples a comprovação empírica da medição e da eficácia do desenvolvimento das capacidades de liderança. Um dos pontos mais explorados é justamente a diferença entre o gerente e o líder. Em geral, o gerente é visto como aquele que planeja, organiza, dirige e controla as tarefas necessárias ao cotidiano da empresa, numa visão muito semelhante à de Henri Fayol. Já o líder seria aquele que inova, inspira e conduz pessoas a um objetivo.

Este trabalho é voltado para análise do gerente-líder, ou seja, aquele que tem de fato e de direito a missão de conduzir um time de pessoas a determinado objetivo, como foi o caso do Brigadeiro Nero Moura.

Ao abordar o tema “estilos de liderança” é comum nos remetermos aos estilos autocrático, liberal e democrático, propostos no trabalho de WHITE & LIPPITT (1939), que são amplamente estudados nas escolas de formação das Forças Armadas. Embora esses modelos de liderança sejam considerados até hoje, eles não são suficientemente robustos para suportar o dinamismo que é exigido de um líder diante das inúmeras situações que lhes são impostas no dia-a-dia. Dessa forma vários estudos se seguiram na tentativa de identificar quais seriam as melhores práticas a serem adotadas pelo líder para levar um grupo ao sucesso num ambiente em constantes transformações e com o surgimento constante de novas ameaças.

Dentre as modernas teorias de liderança estudadas, uma delas - apresentada por HERSEY & BLANCHARD (1986), denominada Modelo de Liderança Situacional – mostra-se muito correlacionada com o estilo de liderança praticado pelo Brigadeiro Nero Moura quando conduziu o 1o GAvCa a impressionantes resultados. Julga-se então que tal modelo muito provavelmente seja apropriado para o comando de unidades de combate da FAB, sendo a sua descrição apresentada no capítulo seguinte.

  

3. LIDERANÇA SITUACIONAL

“...Quando lá chegamos enfrentamos uma nova realidade em relação ao que havíamos treinado. Nos ocorreu de solicitarmos aos americanos que nos ensejassem um treinamento prévio de bombardeio picado, ao que nos foi respondido: “Pois não...Mas do outro lado do Bomb Line. Isto é, o treinamento vocês farão em cima dos tedescos.”

Brigadeiro Fortunato Câmara de Oliveira

 
Baseados em observações acerca da eficácia dos estilos de liderança, Paul Hersey e Kenneth Blanchard (1986), pesquisadores do Center of Leadership Studies, Califórnia, EUA, desenvolveram a partir do final da década de 1960 o modelo da Liderança Situacional, o qual parte da premissa de que a liderança eficaz é uma função de três variáveis: o estilo do líder, a maturidade do liderado e a situação.

Este modelo vem sendo amplamente discutido e aperfeiçoado ao longo de anos, através de contribuições de pesquisadores do mundo inteiro, sendo que os autores dessa teoria lançaram em 2007 nos EUA a 9ª versão (somente em inglês) do livro “Management of Organizational Behavior” (HERSEY, BLANCHARD & JOHNSON, 2007).

3.1. O Comportamento do Líder

Hersey e Blanchard estabeleceram quatro quadrantes básicos de comportamento do líder, em função da ênfase dada aos aspectos da produção (tarefa) e do empregado (relacionamento). Surgiram, assim, quatro combinações: tarefa alta (muita ênfase na tarefa) e relacionamento baixo (pouca ênfase no relacionamento); tarefa alta e relacionamento alto; tarefa baixa e relacionamento baixo; tarefa baixa e relacionamento alto. A figura 1 apresenta os quatro quadrantes de comportamento do líder.

O comportamento de tarefa relaciona-se à estruturação do trabalho. Quanto mais alto o comportamento de tarefa, mais o líder se empenha em planejar, controlar, organizar e dirigir seu subordinado. Quanto mais baixo o comportamento de tarefa, mais o líder deixa estas atividades a cargo do subordinado.

O comportamento de relacionamento refere-se ao apoio dado ao subordinado. Quanto mais alto o comportamento de relacionamento, mais o líder se empenha em oferecer apoio sócio-emocional e canais de comunicação ao liderado.

Hersey e Blanchard apontam para a necessidade de acrescentar uma terceira dimensão a este modelo, a dimensão da eficácia. O estilo de comportamento passaria a integrar-se, deste modo, com os requisitos situacionais de um ambiente. O estilo eficaz seria aquele apropriado para a situação. A tabela 1 apresenta cada estilo aplicado a situações nas quais é apropriado e nas quais não é apropriado, resultando em sua eficácia ou ineficácia.

Modelo Hersey & Blanchard 
Figura 1 - Modelo de Hersey e Blanchard de Liderança Situacional

Salientam os autores que um dos aspectos condicionantes da eficácia do comportamento do líder diz respeito à maturidade dos liderados. Para cada tipo de maturidade haveria um estilo mais apropriado de liderança.

3.2. A Maturidade dos Liderados

Segundo Hersey e Blanchard (1986, p.187), "maturidade é a capacidade e a disposição das pessoas de assumir a responsabilidade de dirigir seu próprio comportamento".A capacidade está relacionada com o conhecimento e a habilidade necessários, ou seja, com o aspecto de saber o que fazer e como fazer, o que pode ser conseguido através de comunicação e treinamento.

A disposição está relacionada com a confiança e o empenho, com o querer fazer, com a motivação. É possível, assim, estabelecer quatro tipos de maturidade:

a) M1 - pouca capacidade e/ou rara disposição;
b) M2 - alguma capacidade e/ou ocasional disposição;
c) M3 - bastante capacidade e/ou freqüente disposição; e
d) M4 - muita capacidade e/ou bastante disposição.

O nível de maturidade pode ser aplicado a indivíduos ou a grupos. O líder que trabalha com um grupo pode determinar sua maturidade através da observação da predominância de maturidades individuais. Hersey e Blanchard salientam também que a maturidade de um indivíduo ou de um grupo não é absoluta, mas varia de situação para situação. Dependendo da atribuição, o indivíduo ou o grupo podem assumir diferentes níveis de capacidade e disposição.

3.3. O Estilo do Líder e a Maturidade dos Liderados

De acordo com Hersey e Blanchard, para fazer face aos diferentes tipos de maturidade, o líder eficaz deve utilizar-se de diferentes estilos de liderança. Cada nível de maturidade suscita um estilo adequado de liderança, conforme ilustra a figura 1.
M1: Estilo de liderança E1, onde o líder deve fornecer instruções específicas e supervisionar estritamente o cumprimento da tarefa. O estilo deve ser de determinar. A decisão deve ser tomada pelo líder.
M2: Estilo de liderança E2, onde o líder deve explicar suas decisões e oferecer oportunidades de esclarecimento. O estilo deve ser de persuadir. A decisão deve ser tomada pelo líder com diálogo e/ou explicação.
M3: Estilo de liderança E3, onde o líder deve apenas trocar idéias e facilitar a tomada de decisões. O estilo deve ser de compartilhar. A decisão deve ser tomada pelo líder/liderado, com incentivo pelo líder.
M4: Estilo de liderança E4, onde o líder deve transferir para o liderado a responsabilidade das decisões e da sua execução. O estilo, neste caso, deve ser de delegar. Cada estilo de liderança é uma combinação de comportamentos de tarefa e de relacionamento (figura 1).

As seguintes relações podem ser feitas:

a) E1: Tarefa alta e relacionamento baixo.
b) E2: Tarefa alta e relacionamento alto.
c) E3: Tarefa baixa e relacionamento alto.
d) E4: Tarefa baixa e relacionamento baixo.

Para promover o crescimento do indivíduo para o nível de maturidade mais alto (M4), não basta apenas que o líder determine o nível de maturidade de seu liderado e aplique o estilo de liderança mais adequado. Este é um requisito necessário mas não suficiente. O líder precisa conduzir um processo de amadurecimento do liderado, que deve ser lento e gradual, sempre no sentido M1 até M4.

A chave da utilização da Liderança Situacional consiste em avaliar o nível de maturidade dos liderados e comportar-se de acordo com o modelo. Na Liderança Situacional está implícita a idéia de que o líder deve ajudar os liderados a amadurecer até o ponto em que sejam capazes e estejam dispostos a fazê-lo. Esse desenvolvimento dos liderados deve ser realizado ajustando-se o comportamento de liderança, ou seja, passando pelos quatro estilos [...] (p.193).

A Liderança Situacional baseia-se na premissa de que para pessoas com pouca capacidade e disposição (M1) é preciso mais controle e estruturação das tarefas. À medida que a pessoa vá se tornando capaz (M2), o controle deve ir diminuindo e o apoio sócio-emocional deve ir aumentando. Uma vez que a capacidade e a disposição tornam-se ainda maiores (M3), o líder deve diminuir ainda mais seu controle e também seu comportamento de relacionamento. Finalmente, para pessoas com alta maturidade (M4), já não é mais necessário apoio sócio-emocional. Estas pessoas preferem a autonomia, sentindo-se satisfeitas quando as tarefas e as decisões são deixadas por sua conta. Porém, "isto não quer dizer que haja menos confiança mútua e amizade entre líder e liderado. Pelo contrário, a confiança e a amizade são maiores ainda, mas o líder precisa adotar menos comportamento de apoio para provar isso" (p.193).

Hersey e Blanchard (p.263) ressaltam que as pessoas estão sujeitas, por fatores internos e externos à organização, a regredir em seu nível de maturidade. Neste caso, o líder deve reavaliar a maturidade do subordinado, voltando ao estilo de liderança adequado, a fim de fornecer-lhe apoio sócio-emocional e direção apropriados. Os líderes devem estar constantemente atentos às situações de regressão, pois, de acordo com Hersey e Blanchard (p.267), o processo de retorno a um estágio já anteriormente alcançado será tão mais dispendioso quanto o tempo decorrido entre a regressão e a efetiva intervenção de apoio.



Tabela 1 - Situações de eficácia e ineficácia do comportamento do líder
 

ESTILO

EFICÁCIA

INEFICÁCIA

Tarefa Alta Relacionamento Baixo 

  Visto como tendo métodos bem-definidos para atingir os objetivos que são úteis aos subordinados. 

Visto como alguém que impõe métodos aos outros; às vezes visto como desagradável e interessado só em resultados de curto prazo. 

 Tarefa Alta Relacionamento Alto

 Visto como alguém que satisfaz às necessidades do grupo estabelecendo objetivos e organizando o trabalho, mas também oferecendo um alto nível de apoio sócio-emocional.

 Visto como alguém que usa mais estruturação do que o necessário para o grupo e que muitas vezes não parece ser sincero nas relações interpessoais.

 Tarefa Baixa Relacionamento Alto

 Visto como alguém que tem confiança implícita nas pessoas e que está interessado principalmente em facilitar a consecução dos objetivos delas.

 Visto como interessado principalmente em harmonia; às vezes visto como não disposto a cumprir uma tarefa se esta implicar no risco de romper um relacionamento ou perder a imagem de uma pessoa boa. 

 Tarefa Baixa Relacionamento Baixo

 Visto como alguém que delega adequadamente aos subordinados as decisões sobre como fazer o trabalho e oferece pouco apoio sócio-emocional quando o grupo não precisa muito disso. 

  Visto como alguém que oferece pouca estruturação ou apoio sócio-emocional quando isso é necessário aos membros do grupo. 
 

FONTE: Hersey e Blanchard (1986, p.123)

3.4. Exemplo prático

A seguir será apresentado um exemplo prático (hipotético) vivenciado comumente em unidades de combate, relacionado com a instrução de vôo. Neste exemplo, o instrutor (IN) desempenha o papel de líder e o aluno o papel de liderado, conforme duas situações diferentes apresentadas abaixo:

1 – Piloto A, Capitão-Aviador, recém-chegado a uma unidade da primeira linha, iniciando o curso de formação em uma nova aeronave. Após ter concluído a instrução teórica e a fase de simulador com aproveitamento, realizará a sua primeira missão pilotando efetivamente uma aeronave duplo-comando com IN a bordo.

2 – Piloto B, Tenente-Aviador com experiência de mais de 1000 horas na aeronave. Atingiu todas as qualificações possíveis para o seu posto. Esteve afastado do vôo por 2 meses para efetuar um curso e fará um vôo de readaptação à aeronave. Realizou as provas de emergência e teórica da aeronave, assim como o simulador de vôo. Encontra-se plenamente preparado para o vôo de readaptação que será realizado em aeronave duplo-comando com o mesmo IN a bordo. Analisemos o nível de maturidade, o comportamento esperado do líder (IN) e os resultados atingidos através da tabela 2, exposta abaixo:

Tabela 2 – Exemplificação do Modelo de Liderança Situacional
PILOTO NÍVEL DE
MATURIDADE
ESTILO DE
LIDERANÇA
IDEAL
ADOÇÃO DE
OUTROS
ESTILOS
A   M1 – piloto muito dedicado e experiente em outras aeronaves, porém ainda não possui competência para pilotar plenamente a nova aeronave.  E1 – liderado necessita de supervisão estrita, devendo receber a orientação necessária para facilitar o seu aprendizadoLiderado poderá ficar desmotivado e se sentir incapaz de realizar a tarefa porque o IN não soube lhe transmitir os conhecimentos necessários.   A liderança será ineficaz. 
 B    M4 – piloto muito experiente e plenamente competente para realizar o vôo. Necessita apenas de uma readaptação. E4 – liderado necessita de pouca supervisão, sendo capaz de decidir sozinho sobre a condução do vôo.   

Liderado poderá ficar irritado com o IN, achando não ser merecedor da sua confiança, levando-o à desmotivação e à conseqüente ineficácia da liderança.

FONTE: Autor.

Através da tabela 2, observa-se que o comportamento do líder deve variar de acordo com a situação, ora exercendo mais supervisão e orientação, ora delegando completamente a tarefa ao liderado. Ao não desempenhar o comportamento esperado, uma reação negativa por parte do liderado é esperada, como mostra a última coluna da tabela.

Mesmo sendo este um exemplo muito simples, percebe-se o porquê do sucesso dessa Teoria: ela é muito fácil de ser compreendida e aplicada. Embora situações como esta ora exemplificada sejam comuns no dia-a-dia das organizações, não necessitando de grandes teorias para ser posta em prática, estabelecer a maturidade dos liderados, bem como o comportamento mais adequado do líder diante de cenários complexos não é uma tarefa fácil. O mérito dos formuladores dessa teoria foi desenvolver uma ferramenta simples e adequada para que o gerente realize os diagnósticos necessários sobre o seu grupo, além de apontar os caminhos necessários para treinar jovens gestores para a instigante atividade da liderança.

O próximo capítulo realiza um paralelo entre os desafios enfrentados pelo Brig Nero Moura frente a uma nova unidade operacional, que precisou se capacitar em tempo recorde para ser empregada no teatro de operações da Itália durante a Segunda Guerra Mundial.

 

4. O BRIGADEIRO NERO MOURA E A LIDERANÇA SITUACIONAL
 

“Aí está um traço do caráter deste homem. Exerceu o comando sem usar somente os galões. Comandou com o exemplo. A liderança era exercida em terra e no vôo. Quando nos comandava no ar, tínhamos a certeza de chegar ao alvo no minuto certo. Expunha-se ao fogo antiaéreo igualzinho aos seus tenentes. Muitas vezes desci com ele em locais como Casarsa, Isola di Scala e Legnago para realizar ataques rasantes.”

Brigadeiro Rui Moreira Lima

Segundo os relatos dos nossos heróis veteranos de guerra sobre a postura e a conduta do Comandante, Brigadeiro Nero Moura, depreende-se que ele soube intuitivamente adaptar o seu estilo de liderança às diversas situações enfrentadas pelo Grupo de Caça, de modo muito similar à metodologia proposta por Hersey & Blanchard.

Segundo relatos do Maj.-Brig. José Rebello Meira de Vasconcelos, o recrutamento do pessoal com destino ao 1º Grupo de Caça foi feito com base no voluntariado para todos os níveis hierárquicos. O Grupo escolhido seguiu para Orlando, Flórida (EUA), com vistas ao treinamento inicial na Escola de Tática Aérea Aplicada, voando cerca de 60 horas no P-40. O fato de o grupo ter sido voluntário, por si só, já baliza que a equipe ali formada possuía grande disposição e motivação para as tarefas que lhes seriam atribuídas. Porém era um grupo sem experiência em combate, como cita o Brigadeiro Meira, sugerindo, de acordo com o modelo da Liderança Situacional, que o grupo possuía inicialmente baixa maturidade para a tarefa (M1).

Ainda citando o Brig. Meira, “logo que assumiu o Comando, o Brig. Nero Moura escolheu com critérios pessoais os oficiais que iriam compor o escalão de comando, entre eles e principalmente o Oficial de Operações e os quatro Comandantes de Esquadrilha.” Nesta fase, muito provavelmente, o Brig. Nero Moura adaptou-se a um estilo de liderança do tipo E1/E2, muito mais voltado para a tarefa, quando os seus subordinados precisavam se dedicar mais ao aprendizado das novas táticas de combate ar-ar e ar-solo, até o encerramento do treinamento na Base Aérea de Suffolk, já voando o P-47 (Vide “Estória Informal da Caça, vol. IV).

Constata-se facilmente que a fase de formação foi extremamente penosa, em um país estrangeiro, com muita cobrança sobre o desempenho e sob rigorosa disciplina de vôo. Segundo os teóricos, sob tais condições, o grupo só chegaria ao sucesso e atingiria a eficiência desejada sob o comando de um líder que adotasse o estilo E1/E2.

Próximo ao término da guerra, devido ao não recompletamento de suas equipagens, embora o Comandante insistisse com a sua cadeia hierárquica sobre esta necessidade, o Brig Nero Moura provavelmente adaptou-se a um estilo de liderança do tipo E4, pois contava com pilotos extremamente experientes voando nos céus da Itália, verdadeiros “veteranos”no TO, comprovando que haviam atingido o nível máximo de maturidade para a tarefa (M4). Segundo o Brig Rui, a familiaridade com o terreno era tão grande, que os pilotos sentiam a presença do inimigo e a sua disposição no terreno por simples disparos de AAAe. A falta de recompletamento fez com que nossos pilotos voassem uma média de 70 missões, enquanto que os pilotos americanos voavam entre 35 e 50 missões (LIMA, 1980).

Muito provavelmente, se o Brigadeiro Nero Moura não tivesse adaptado seu estilo de comando à evolução da situação, o Grupo não teria alcançado tanto sucesso.

Passagens citadas pelo Brigadeiro Rui, como, por exemplo:
-“Ele foi justo e exigente conosco. A indisciplina de vôo nunca foi tolerada. Dava cadeia no duro. Não há no Grupo uma voz que se erga contra ele...
- “O convívio diário faz com que o homem apareça de corpo inteiro. Não se pode enganar ninguém por muito tempo. Daí ele nos conhecer tão bem. Daí nós o conhecermos tão bem. Jogava vôlei, ia à praia de Marina de Pisa, bebia com a gente e nos comandava como se deve comandar homens livres. O escalão terrestre e os pilotos estimavam o Coronel Nero sem esforço. Até aquele seu `Não característico, esperado quando alguém lhe fazia qualquer postulação, era bom de ouvir. O Não dele era sempre o início de um Sim.”
- exemplificam a habilidade desse comandante em transitar entre diferentes estilos de liderança, conforme a situação requeria. Outro fato curioso sobre a liderança de Nero Moura é a grande semelhança de suas atitudes quando comparadas a grandes líderes guerreiros, como pode-se concluir da obra de Owen Connelly - professor de história da Universidade da Carolina do Sul e ex-integrante do Exército americano - “On War and Leadership: The Words of Combat Commanders from Frederick the Great to Norman Schwarzkopf”, editado em 2005. Nesta obra, o Dr. Connelly descreve as habilidades de 20 grandes comandantes que de fato participaram lado a lado de seus homens nos campos de batalha em guerras ocorridas entre 1760 e 1990. Nota-se que esses grandes líderes apresentaram em comum as seguintes habilidades:

  • Unidade de comando, sabendo, porém, delegar com propriedade;
  • Liderança pelo exemplo;
  • Cuidado com a sua tropa (acompanhar os subordinados nos campos de batalha e prover os meios necessários e a assistência adequada);
  • Boas iniciativas e capacidade de improvisação;
  • Possuir o conhecimento necessário para projetar ações futuras; e
  • Tomar decisões corajosas e de acordo com a situação.

Por fim, ressalta-se que identificar precisamente qual o estilo de liderança adotado pelo Brigadeiro Nero Moura não é o centro desta discussão. Ele foi um líder incontestável e a sua postura sempre servirá de exemplo às gerações mais novas de caçadores, independente de qualquer teoria de liderança. O interesse maior deste trabalho é sugerir um modelo que seja adequado à formação dos nossos líderes, cujas premissas principais tenham um respaldo de quem precisou aplicá-las diante do calor do combate.

  

5. CONCLUSÃO
 

“Comandá-los e tê-los conduzido nesta jornada que agora se encerra com a grande vitória final, foi sem dúvida o maior privilégio que a mim poderia o destino ter reservado”

Pisa, 09 de maio de 1945 – Nero Moura – Tenente-Coronel-Aviador

Este trabalho procurou demonstrar as vantagens de se estudar uma teoria de liderança robusta e amplamente difundida tanto no meio acadêmico quanto empresarial, conjugada a uma experiência bem sucedida de liderança durante uma guerra, de forma a preparar e treinar líderes atuais e do futuro.

Como a literatura carece de modelos de liderança que possam ser empregados especificamente em situações de guerra, não podemos deixar sob a poeira a experiência adquirida a duras penas por nossos heróis nacionais, em especial por aqueles que foram incumbidos da função de comando.

Ao conjugar uma teoria adequada com a prática nos campos de batalha, temos uma grande oportunidade para extrair riquíssimos ensinamentos que poderão fazer a diferença num caso de conflito.

Julgar de forma exata qual foi o estilo de liderança adotado por um grande líder durante uma guerra tem pouca importância, pois as suas atitudes e exemplos já são suficientes. Porém, é justamente a partir de lideranças bem sucedidas que os pesquisadores desenvolvem as suas teorias, tentam fazer correlações e elaboram metodologias –umas mais aceitas do que outras- visando somente a apontar as práticas que incontestavelmente darão certo diante de complexas situações.

A Força Aérea precisa de um número muito maior de líderes do que a natureza por si só pode oferecer; e mesmo os líderes-natos necessitam de treinamento. Então não há outro caminho se não o de investir pesadamente na formação de nossos combatentes, e é nessa hora que as teorias se aplicam, apontando um caminho inicial a ser seguido.

A teoria da Liderança Situacional, numa avaliação inicial, mostra-se adequada para a aplicação em situações de combate. Além do mais, os seus autores apontam caminhos e propõem ferramentas para que se saia de um ponto A e se chegue a um ponto B (em termos de aprendizagem) de uma maneira simples e prática. Por outro lado, tal fato não descarta as outras teorias, que também podem vir a ser estudadas e aplicadas com sucesso. 

   

David Almeida Alcoforado - Tenente Coronel Aviador
 

  

REFERÊNCIAS

  • Associação Brasileira de Pilotos de Caça. Estória Informal da Caça: a formação de pilotos de caça no Brasil, Vol IV. Rio de Janeiro: GR3 comunicação e Design, 2009.
  • CHIAVENATO, Idalberto. Administração Geral e Pública. Rio de Janeiro: Elsevier, 2008.
  • CONNELLY, Owen. On War and Leadership: The Words of Combat Commanders from Frederick the Great to Norman Schwarzkopf. Princenton: Princenton University Press, 2005.
  • DESCALS, Francisco J. Psicología de la Organización. Madrid: Pearson-Prentice Hall, 2005.
  • HERSEY, Paul H., BLANCHARD Kenneth H., JOHNSON, Dewey E. Management of Organizational Behavior. Prentice Hall. Upper Saddle River: 2007.
  • HERSEY, Paul H., BLANCHARD, Kenneth H. Psicologia para administradores: a teoria e as técnicas da liderança situacional. São Paulo: EPU, 1986.
  • HUNTER, James C. O monge e o executivo – uma história sobre a essência da liderança. Rio de Janeiro: Sextante, 2004.
  • LAVANÈRE-WANDERLEY, Nelson Freire. História da Força Aérea Brasileira. Rio de Janeiro: EGB, 1975.
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  • LIMA, Rui Moreira. Senta a Pua! Rio de Janeiro: BIBLIEX, 1980.


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